sábado, 4 de junho de 2011

MOMENTO II

MásCaras
Momento II

Eu vim. E vim para mudar o que escrevi na carta.
Eu já entendi. Já sei porque chegamos aqui.
Eu queria, Amós, antes de sair daqui, ouvir um “eu te amo” pela sua boca. Quem nunca me disse isso foi você e não eu.
Hoje você vai dizer "EU-TE-A-MO". Acredite, eu ainda preciso da sua fala. Eu não quero desculpas para que você finja que falou: “É claro que sim, Fieda.”, “Será que não...”, “Que pergunta, Fieda!”. Só quero as palavras, só elas são responsáveis para que eu saia com gozo daqui. Só aceito "Eu te amo".
Nunca tive uma declaração de amor pública na vida. Sabe o que é isso, Amós? Não, uma pessoa tão adorável como você não pode saber. Todos te amam e dizem que te amam. Você não sabe o que é isso, Amós, para uma pessoa como eu que vê e ouve tantas histórias de amor o tempo todo. É isso o que faço horas e horas na net, caçando e vivendo histórias de amor que não são as minhas. Porque na minha não constam declarações, ligações para dar um boa noite, um sentimento de saudades, vontade de morar junto. Na minha história, pouco existe a palavra nós.
Você pensa em comprar a sua casa, Amós.
E eu sempre pensei em comprar a nossa.
Você pensa em trazer tudo seu.
E eu pensando em misturar tudo nosso.
 É, acho que as gaiolas podem aparecer abertas para mim. Você tem razão.

Amós:E então tudo amornou. Você idealizou a nossa relação.

Não é questão de idealizar ou não. É de deixar claro.De viver. De querer e dizer que quer. E ser amada de verdade, não na suposição de que há amor. Ter o ego garantido por uma única pessoa que não fosse a própria. Ter certeza de que há plenitude nessa relação. Era só por isso e você não me deu.
Esperei uma entrega maior, um ano, dois, três...Eu só vim porque estava intalada. E hoje você vai dizer com todas a letras que me ama, sabe por quê? Porque está diante dos seus olhos o momento do nosso fim. Pode dizer, eu só quero ouvir isso. Diga...

Não tenha medo de utilizar essas palavras. Você já deve ter usado algum dia. Use-as comigo, vamos...

Amós: Fica.

Tudo bem, eu já não amo ao ponto de querer ouvir isso. Só queria saber até onde vai a brincadeira...

Amós:  Escreve para mim.

Escrevo.

domingo, 15 de maio de 2011

Minha língua é minha farsa.

MINHA LÍNGUA É MINHA FARSA
Daniel Arcades

            Dentro de casa. Uma língua afetiva. A do bom filho que pede o almoço a mãe, que desconhece os palavrões e não ingere álcool de maneira nenhuma. A língua do garoto de dentro de casa é aquela que não se preocupa com a formalidade, mas mantém a ordem nela e ai dele que não mantenha... Xingar na frente da mãe? Nem pensar! Não sejamos tão informais, não é, mamãe?
            Na escola. Uma língua exibida. A do estudante que sabe falar um monte de coisa, dos estudos químicos, a “pegação” do beco escuro. A língua do estudante é aquela que quer mostrar sapiência e ao mesmo tempo estar inteirado nas situações cotidianas joviais. Na escola é que xingar sem mamãe  e professor ver. Palavrões? E lá que se aprendem todos os substantivos obscenos para serem utilizados em advérbios proibidos e falar e ouvir adjetivos.
            No trabalho. Uma língua mais séria, mais adulta. O trabalhador sabe que a sua língua tem de ser diferente. Ela tem que ser mais preguiçosa, o inverso das suas mãos. A língua tem de trabalhar menos para não complicar a caixa que a guarda. A língua do trabalhador só diz o necessário, e isso inclui reclamar do salário.
            Na cama. Uma língua muda. As onomatopeias aparecem em interjeições fantásticas.  O amante faz uso dos sinais com ela, percorre os caminhos mais dignos de serem desbravados no corpo de alguém e fala pouco, muito pouco.
            Na boca. A língua mentirosa. As diversas características que ela assume e se apropria de forma tão convincente das características do momento, que chego a pensar que é real o que se passa ali. Filho, estudante, trabalhador, amante. Ai, que loucura! Qual é a minha língua? Qual é a que assumo?
            Não há minha língua. “Mamãe!”, o filho é o que a mãe quer que seja. “Sim, professor”, “Porra,borá filar?”,  o estudante é o que os outros alunos e professores querem que seja. “Boa tarde a todos que aqui se encontram reunidos...Pois não, senhor.”, o trabalhador, esse não precisa nem falar. “Ai! Ui! Ai!”, e o amante quer dar prazer, e só. Minha língua, só e somente minha,  não existe. É a sua língua. A língua que você quer com o paladar que desejar. E mente mente, acredita que eu digo algo.
            Em tudo há um pouco de mim. E em tudo há farsa em mim.

O almoço dos olhos


O almoço dos olhos


            Como fogo. Era assim que as íris flamejantes gritavam dos olhos de Diogo e recebiam o descaso que sussurrava pelo olhar consciente de Camila. Faca na mão. A briga entre o fogo e a água era de cortar o coração de Mariana, pobrezinha, tão nova e já envolvida numa das situações mais dificultosas do homem. Um corte ágil da faca. Por menor que seja a morte, a terra chora em todas elas. O chão de Diogo, embora matasse sugando para o núcleo da terra a história passada, chorava. Mariana tinha a água nos olhos, mas era de ar. Tão leve a sua aura e tão puro o sentimento daqueles olhos castanhos que não podia, não merecia presenciar as situações que colocavam a dualidade de caráter das pessoas que ela mais amava em jogo.Vários cortes:
            - Dá pra você parar de fazer o almoço? Talvez hoje ele não seja mais necessário.
            As mãos de Camila travaram. Faca na mesa. A cachoeira de confiança própria que saltava dos olhos de Camila causou um desespero maior ao fogaréu que acompanhava a pele de Diogo. Ela sabia que hoje haveria almoço naquela casa e que a faca precisava continuar a cortar. Mas as mulheres sabem ceder na hora certa, sabem que os homens ingenuamente acreditam na sua potência ditatorial. Elas são o Chico Buarque escrevendo Cálice e eles, a censura deixando a música tocar nas rádios. Voltemos à faca na mesa. Aquele objeto precisava voltar a cortar e fazer do meio-dia mais um momento rotineiro e necessário:
            - O que foi? Nós vamos almoçar fora?
            - Camila, por favor. Não ache que está tudo normal na situação em que nos encontramos.
            -E o que há de errado?
            -A nossa relação.
            Mariana entendera o que estava acontecendo naquela cozinha e não sabia se voava como furacão dali ou apareceria em brisa tentando acalmar aquela confusão de elementos. O fogo estava alto e a água não era suficiente para apagar aquele incêndio. E a culpa era de Camila:
            -Minha culpa? Minha culpa? Foi justamente por amor que me entreguei a esta situação. Simplesmente para conservar um amor de uma longa história que me dispus a fazer essa façanha. E agora estou sendo julgada por esses homens que nada sabem de amar. O que me ama e o que me escreve. Ambos não entendem a minha ação. Continuarei a cortar a carne que será servida em pouco tempo.
            Faca na mão. Jogo de olhares. Um indignado, o outro, receoso, mas confiante. Aqueles olhos que enchem o espaço de palavras traduziam todo o diálogo para Mariana, que continuava com o mar a desabar nas pálpebras. A sua vontade era de soprar todo aquele momento. E ela não sabia se a faca de fato, permaneceria a trabalhar:
            - E você, sabe de amar? – indagou Diogo recebendo um pouco de água nas labaredas dos olhos.
            - Não, não sei. Mas sei que é muito mais do que a noite que tive e muito menos do que você pensa ser. Sei que depois de certo tempo ele toma outras dimensões e tem outras necessidades, que ele compreende, que ele não está em VOCÊ. Embora passeie por nós dois.
            - Ele não é de dar passeios e sim de colocar pregos no chão e fixar-se em um lugar.
            -Pregos machucam e ele não faz isso.
            -Passeios podem não ter voltas.
            -O caminho sempre existiu, cabe ao homem querer ou não andar de ré.
            -É difícil voltar quando se passeia por lugares diferentes. Se ele só quer passear por nós, diga a ele que dispenso a caminhada e prefiro procurar outras mãos.
            Não era isso que os olhos de Diogo queriam dizer, mas o olhar de Camila ouviu perfeitamente aquele fogo infantil, romântico, que já não era mais para existir faz tempo.
            - E você vai terminar a história aqui? – Indagou Camila,já sabendo qual resposta seria.
            - Vou terminar um capítulo dela. A história não tem por que acabar. O protagonista dela ainda vive.
            - E pode ficar tranqüilo que ele também terá um final feliz como todos os outros protagonistas: A mocinha e o mocinho vão viver felizes para sempre.
            Ponta da faca na pia. Olhares sedutores. Não, ainda não é o momento da troca de órgãos na narrativa, continuemos a falar de olhares, pois são os que dizem a verdade e são capazes de traduzir tudo o que se passa na história com maior veracidade nesse humilde papel. As mãos de Camila nunca ficaram tão firmes no cabo da faca e agora não era para cortar nenhum legume. Aquele era o seu mastro no momento e suas duas mãos seguras elevavam os ombros da mocinha que se tornava majestade naquele instante:
            - Sabe por que a história não acaba aqui, Diogo? A narrativa vem sendo muito calminha. Até então, os nossos gritos não tiveram a ênfase necessária para dar emoção a essa historinha tão repetida e tão cotidiana. – dizia a boca que estava abaixo dos olhos sedutores femininos -  Atire a pedra em mim, Jesus Cristo. Vamos, atire.
            - Essa “historinha” cotidiana não devia ter entrado nessa casa! Não é caso de atirar pedra, mas de cuspir na cara. E o clímax da história aconteceu muito antes do conflito. As suas mãos e o seu sexo foram os grandes personagens desse digno  folhetim das oito.O mocinho é sempre o sem sal, não é mesmo?
            - Mas é ele que arranca suspiro das jovenzinhas e despertam a vontade do matrimônio. Você ainda é meu, Diogo. Eu casei com o mocinho. Que traz os beijos cheios de amor, de segurança, de continuidade. – Dizia Camila. Dizia os olhos. Dizia o sorriso.
            Os lábios femininos tomaram os dedos de Diogo. Apesar de sensual, aquilo era uma fronte e a discussão não podia avançar de tamanha forma. Uma linda cascata saltava dos olhos de Camila, e desabava sobre seus lábios que molhavam cada vez mais os dedos de Diogo, as mãos, os braços, o peito, a barriga...:
            - Mãe!
            Era Mariana. Havia decidido sair como furacão e correu para os braços da mãe sem querer enxergar aquela cena. Apesar da pouca idade, a menina sabia que aquele jogo poderia trazer um tornado dentro da casa nesse dia. Eram três olhares que se confrontavam agora e não sabiam qual era a próxima ação, o fogo ainda queria incendiar a casa, embora o vento e a água estivessem prontos para apagar a chama que ali se instalara. Mariana percebeu a situação de guerra. Eram elementos distintos que vão lutar livremente na selva interna de um casal. Seus olhos não podiam tirar todo o lirismo que a figura do pai e da mãe traz na cabeça de uma pequena. E percebendo que não devia permanecer ali, pois a guerra já estava instaurada, Mariana pediu humildemente à mãe:
            - Me tranca no quarto?
            E sem muita pena, a mãe trancou a espectadora no quarto. Era melhor não haver saída para que o vento não atrapalhasse a guerra de olhares. Camila volta do quarto. Faca na mão:
            - Diogo, tira isso da sua mão.
            A faca que cortara tomates e carne estava prestes a cortar a pele de Camila:
            - Não, ele não teria coragem. Não é homem o bastante para isso. E essa faca mais o assusta do que encoraja. O coitado queria ter ao menos um momento de loucura na vida, mas ele não consegue, não tem autenticidade o bastante para assumir uma loucura. Os homens são fracos e mentirosos. Conseguem construir um mundo, mas não conseguem se construir.
            Os sorrisos de Camila agora falavam mais que o olhar. Ela chegou perto dele (eis o momento de narrar as falas de outros órgãos) e sorriu. Aquele sorriso era talvez o maior grito de orgasmo que uma mulher pode ter dado. A faca agora estava sendo segurada por quatro mãos. Um corte. Dois cortes. Vários Cortes.Nenhum sangue.
            Camila estava entregue como nunca esteve ao seu marido. Seu vestido todo fatiado estava pelo chão e seu corpo nu era banhado pela energia da certeza da fragilidade de Diogo. Seu sexo pulsava e ela, de água, molhava seu corpo com o gozo daquele momento. As mãos de Diogo não queriam passear pelo corpo da esposa, mas de olhos já bastam todas as páginas anteriores. É preciso fazer outra coisa, modificar.
Faca no chão. Corpo na mesa. Banquete a ser servido:
            -Sabe por que você não vai me deixar? Porque precisa disso. Precisa de mim para não mudar. – disse Camila entre a respiração ofegante e os sons de gemidos que exortavam seu corpo.
            Diogo está pronto para terminar a relação, mas aquele corpo o tomara como carne e o fizera humano novamente. E estava certo de fechar o capítulo com o término do romance entre o mocinho e a mocinha. As mãos passeavam, os sexos encaixavam, os olhares não se cruzavam e o suor misturava. É na cozinha que se esquenta comida e hoje, segundo Camila, um banquete estava sendo servido:
            - Sabe por que você é meu? Porque nossa filha existe, porque somos um casal lindo para a sociedade, porque faço seu almoço, sua janta. Por que precisa do meu corpo para satisfazer a periodicidade de luxúria do teu.  Porque uma traição só é feita para consertar erros e o nosso já está consertado.
            Não era possível! Porque Camila tinha que tocar nesse assunto logo agora? A traição não é um fato para ser lembrado. Se Diego morresse sem saber disso, os sorrisos permaneceriam tomando conta da história e não apareceriam olhares que explodem em fogo ou em água. O corpo de Diogo desencaixava do dela por conta da maldita frase. Seus olhos voltaram a falar.A faca permanece no chão, o vento no quarto e a disputa no centro. Diogo não quer mais Camila:
            -Percebo que o homem que me escreve nada entende de situações de relacionamento. Eu contei porque quis, para acordar e levantar o que já estava quase enterrado em cimento. E a sua narrativa está errada: Diogo me quer, e muito.
            - Você me tem, Diogo. E eu sei que te tenho, somos a aparência do mundo, a constituição de todo sistema que encontramos. Somos mais dois. E você não vai conseguir ser só mais um. Somos mais dois. As situações passam e continuam a passar. E é só uma vida para estragar. Diogo, essa merda aqui é pra fazer o que bem entender e pra viver, somente viver.- falou Camila justificando a função de ser louca. -  Vou preparar o almoço.
            Diogo estava decidido a sair dali. Muito sínica essa mulher. Toda crise será uma possibilidade de adultério? As coisas são tão naturais assim? Qual a importância de ter uma família na sociedade? No emprego? Diogo não confiava mais na mulher.Faca na mão. Comida na panela. É domingo, meio-dia.Vento no quarto, cheiro na casa:
            - Mariana, vamos almoçar. – Chamou Diogo.
            E a brisa tomou mais uma vez conta da casa. E os sorrisos tomaram conta dos corpos novamente. Mariana sabe que muita coisa mudou, mas prefere entender que elas são mesmo assim. Tão nova, coitada, e já foi obrigada a conhecer a crueldade das convenções.
            Os valores nunca existiram.As verdades são mentiras.
            A faca sempre corta, sempre cortará e ainda fere.


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Conto escrito no segundo semestre de 2008 para o componente curricular Tipologia Textual. 

SER FUNIÔ



Tive contato com esta carta no terceiro semestre da faculdade e até hoje me recordo com muito carinho dela, pois me ensina a verdadeira estratégia que um subalterno deve ter, não foi nenhuma grande teoria, mas a carta deste menino, que me sensibilizou e me ensinou.

domingo, 27 de março de 2011

Lagoas soterradas e dessacralização do teatro

Escrevi este texto para a abertura do Festival Arte e Teatro para todos que acontece em Alagoinhas.
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Nossa, quantas coisas faltam em Alagoinhas! O povo de Alagodeba só quer saber de bar. Existem apenas bares e igrejas nesta cidade, não é mesmo? Ando cansado dos discursos repetidos dos apreciadores da “cultura” Alagoinhense e, sinceramente, não quero ser mais um deles. Não falo mal de quem está no bar e entendo os fiéis na igreja. Agora, penso que se pudéssemos passear pelo bar e pela igreja ao mesmo tempo nossa vida seria mais interessante. Há outros espaços a percorrer.
 Começo a perceber o que mais me aflige enquanto artista e a partir daí mudo todo o meu modo de pensar a arte e de como agir nela.  Por que o teatro é melhor do que certos lugares? Será que ele é mesmo? Eu sei que estou no teatro, mas isso é bom para mim, porque seria para o outro? O que o teatro diz a ele? Sei que deves perguntar agora o que os outros espaços como bares e igrejas dão a eles, acredito que, no mínimo, uma fuga.  Temos a faca e o queijo na mão: o teatro é bar e igreja ao mesmo tempo. Foge, foge, mulher maravilha, lá no centro de cultura tem lugar para você se esconder.
Gerald Thomas disse, em 2009, que iria parar de fazer teatro, por que “não faz mesmo sentido entreter um pequeno número de pessoas presas em cadeiras, vendo "miragens" no palco. Essa mentirinha está mal contada. E eu parei de contá-la.”[1] A indústria trouxe a ideia de massificação e repetição muito forte e tudo, exatamente tudo, seguiu esta filosofia barata de produtividade. Será mesmo? O teatro está tão inútil assim? Se for assim, eu vou parar também. Gerald Thomas voltou para o teatro. Ainda há o que salvar.
Esse texto está recheado de nãos: O primeiro, é que não acho que Alagoinhas tem um processo artístico-cultural menos revolucionário hoje do que dos artistas que fizeram e aconteceram nesta cidade no período da ditadura militar. Bargh. Lascado falando de lascado. Revolução muda definitivamente um espaço e isso não foi o que aconteceu por aqui, mas a nostalgia sempre será positiva...
Não consigo estabelecer comparações entre a minha geração e passadas, pois não acredito na história e sei que daqui a alguns anos os livros vão mostrar o quão rica foi a passagem do século XX para o XXI. Crise do capitalismo, ascensão de negros e homossexuais, derrubada de poderes no ocidente, mulher na presidência do Brasil e tantos e outros fatos que são dignos das páginas indeléveis da ficção oficial aparecerão pintando a nossa geração.  Ontem foi ontem e hoje é hoje. E o teatro no meio disso tudo? Morrer, ele não morreu. Ele está vivinho da Silva, tossindo, escarrando sangue. Ele nem se aposentou, insiste em trabalhar.
Acredito no que faço, mas penso 24 horas em como faço. Não desejo ser um autor-autista que em um palco sozinho faz teatro, apresentando para as cadeiras seu maravilhoso discurso político e sua estética experimental após não sei quantos meses numa sala de ensaio. Mas também não quero ser simplista no meu modo de agir teatralmente, tampouco virar apenas algo comercializável com tantas coisas vistas por aí. Transformo o palco em meu altar, mas o deus aqui é mais próximo do homem, é divino e profano.
Alagoinhas tem teatro. Mas falta algo? É claro que falta, sempre vai faltar. Assim como falta comida limpa em alguns bares, assim como falta Deus em algumas igrejas, sempre há o que faltar. Pra começar, sinto falta de ousadia. Não ousadia no sentindo de experimentar outras coisas (é claro que isso também), mas no sentido de encarar uma estrutura fuleira como a dos artistas de Alagoinhas como se fosse um espetáculo patrocinado pela Petrobrás.  Sinto vontade de me dedicar integralmente. Isso é teatro para mim: um abismo.  Lá, só quem se joga conhece a “dor e a delícia” de estar neste espaço. Só quem reconhece a arte de transgredir em suor e leitura nas práticas mais abusivas do teatro sabe o quanto é necessário ser dele, se dedicar a ele, viver em função dele. O teatro é possessivo, exige seu sangue – mas como é bom me ferir por ele –, é a relação mais sado que já tive na vida. Alagoinhas e seus artistas precisam de mais dor. E, é claro, de muito mais festa, felicidade e arte.
O teatro não pode ganhar o mesmo destino das lagoas de Alagoinhas.  O problema é que ele não deve simplesmente ser a coisa para fazer quando dá. Os artistas Alagoinhenses sobrevivem e fazem sem a qualidade técnica necessária, sem a experimentação, sem a maturidade – pois quando os atores fazem 18 ou 20 anos vão virar gente e entrar em alguma profissão de verdade para falar que um dia fizeram teatro – por que o teatro não dá para ser a primeira coisa a ser feita do dia (e eu não estou falando de escovar os dentes e tomar café da manhã). Aí, ciumento que só, ele também desconta por não ter dado a importância necessária a ele. Castigo de Baco.
Agora, desta vez, sinto que o teatro começa a se ver enquanto sujeito grande, ou vai ou racha. Ou a coisa é encarada de vez ou vamos parar tudo para ficarmos apenas com o que já tem. Profissão, Daniel? Ator. Depois disso vem o estudante, o professor, o filho e o que mais tem de vir.  Chega de fingir que falta arte por aqui, de mostrar o ostracismo presente nas nossas tão inquietas vidas com a arte local, de dizer que nada funciona aqui, chega de mentir. As coisas acontecem e agora é que acontecerão mesmo. Por que se há alguém decidido a transformar o teatro, e somente ele, em forma de vida, esse alguém está escrevendo este texto agora. E como um dono de bar ou um pastor ele se junta aos bêbados e fiéis para erguer o seu templo: um palco – ora bar, ora igreja.
Não dá para brincar mais e os artistas – aqueles que já colocaram este termo na frente dos outros – já sabem disso. Atitudes como o Festival arte e teatro para todos, promovido pelo BAC, o espetáculo Eróticos (provocador na cidade) do teatro Quanta, as apresentações em terreiros de candomblé do Shirê obá da Cia de Teatro Nata, a criação do primeiro grupo de teatro infanto-juvenil na cidade de Alagoinhas – O grão, leituras dramáticas mensais feitas pelo projeto A OCA Lê com diversos artistas do teatro baiano, escolas de danças multiplicarem-se na cidade e a criação de um coletivo de artistas no Centro de Cultura de Alagoinhas mostram que a primeira década do século XXI começa a organizar um novo tempo por aqui.  A virtude não está no meio. É no meio que tudo se desgraça e sujeitos fazem a cabeça dos outros. Para mim, o melhor lugar é do quase extremo, não é o da queda no precipício, mas o da metade dos pés na ponta do abismo. E é para ele que o teatro daqui tem de ir. Se não der certo, não deu. Aliás, o que é dar certo?  Ainda falta? Falta, mas se a fala de Giles Deleuze e Félix Guattari estiver coerente, nossas pequenas grandes ações estão provocando uma revolução no fazer teatral. Não, não começamos isso. Artistas desde o início da história da cidade lutam para uma cultura de apreciação das artes cênicas, do jeito de cada época e cada geração, mas lutam.
O projeto de continuidade está ganhando cada vez mais força. E agora, amigos, força. Por que o movimento decisivo está perto. Acredito neste teatro feito aqui e enxergo a necessidade de mais. Mas enquanto seu lobo não vem... levemos Maomé para os bares, esquinas, escolas, igrejas, casas, rua. É preciso ver mais, fazer mais e mostrar mais. Com quem? Com quem realmente quiser. Parar? Vou não. Quero não. Posso não.
Daniel Arcades

sábado, 19 de março de 2011

quinta-feira, 17 de março de 2011

MásCaras - Carta II


MásCaras

CARTA II

                Não venha. Ao contrário de você, o meu futuro ainda será. Você lembra a música que colocava no som do seu carro toda vez que se despedia de mim?
                Close your eyes and I'll kiss you/ Tomorrow I'll miss you/ Remember I'll always be true /And then while I'm away/ I'll write home everyday/ And I'll send all my loving to you.
                É, eu lembro. E lembro que o seu antigo amor te deu o primeiro beijo ao som dos Beatles. Deve ter sido esta música, com certeza. Quer saber o que acho, Fieda? Ainda existe futuro pra você. Sempre foi o seu passado.
                Aliás, venha. Quando vieres não estarei mais aqui. Deixe a chave que fica contigo sobre a mesa da sala e depois vá. Precisamos nos apagar. Eu só fui um intervalo para algo que te fez mal e sempre quisestes que fosse teu bem.
                Sem mágoas. Sem dores. Não mentes para mim quando diz do seu amor, mas há uma mentira entre a sua mente e o seu coração.
Amós

sexta-feira, 11 de março de 2011

O Inferno da paz

CENA I

                Escuro total. De repente, aparecem dois focos de luz no chão (de um modo que não seja possível a visão do cenário ao fundo) em cima deles, dois garotos de short, mochila nas costas e camiseta de estudante. Olhares no horizonte, parados. A primeira cena não é dinâmica. Totalmente parada, séria, sem muitos movimentos de gesticulação. Valorizar a expressão facial.

Marcelo: E agora, o que é que vai ser da minha vida?
Pedro: E agora, o que é que vai ser da minha vida?
Marcelo: Ué, você também não sabe?
Pedro: Não.
Marcelo: E o que é que vai ser da nossa vida?
Pedro: Não sei.

                Param e continuam olhando para o horizonte, tentando imaginar como seria a sua vida no futuro. A cena fica certo tempo em silêncio.

Marcelo: Um dia eu vou morrer.
Pedro: Eu também.
Marcelo: E se eu morrer amanhã?
Pedro: E se eu morrer amanhã?

                Param, se olham, mas ambos tem medo do olhar do outro, voltam ao horizonte.

Marcelo: Marcelo.
Pedro: Pedro.
Marcelo: 19 anos.
Pedro: 17 anos.
Marcelo: 17?
Pedro: 17.
Marcelo: E já pensa na morte?
Pedro: 19?
Marcelo: 19.
Pedro: E já pensa na morte?

                Se olham novamente e riem levemente.

Marcelo: Eu estou sozinho.
Pedro: Eu também.
Marcelo: Cheguei há pouco tempo.
Pedro: Eu também.
Marcelo: Eu preciso de amigos.
Pedro: Eu também.
Marcelo: Como é que a gente faz pra se conhecer?
Pedro: sei lá. Vai que os dias passem e o destino nos promova isso. Enquanto isso,  vou procurar uma amizade.
Marcelo: É, né? Então Tchau.
Pedro: Tchau.

                Black-out. Música urbana, buzinas, apito de guarda, tiros... Despertador.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

deveria ter gozado
e não te esperado

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

"Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe..."

As palavras e o estômago


 Ah, se todos os momentos fossem o feijão com arroz....
Não, não dá!
é preciso por poesia na comida, um molho diferente, um peixe, um frango no domingo
é preciso por tempero na poesia, não um sazón, mas aquele que minha mãe faz
primeiro ela machuca tudo, depois corta uma cebolinha, uns tratos de verde
tudo pilado e colocado no caldinho marrom do feijão que a Bahia toda come: o carioca

Ah, se tudo se resolvesse num triturador...
Não, não pode!
é preciso dar movimento no modo de mexer no fogão
é preciso que a poesia mexa, não nas hélices de um liquidificador, mas nas cadeiras de minha mãe
com uma colher de pau nas mãos, ela passa a manhã olhando a comida boa que dará aos filhos: a palavra

Ah, se eu me alimentasse só de líquidos...
Não, não desce!
é preciso respeitar a nossa vontade de mastigar
é preciso que a poesia pare, rode, suba, desça e só aí ela estará fixa no meu estômago
preparando um bom bolado de bosta para jogar fora aquilo que eu tinha em mim: a vergonha

Se há poesia, eu posso, minha mãe
comer o feijão com arroz alguns dias
aceitar uma comidinha de liquidificador
e só beber em alguns momentos
Se há poesia, a rotina é uma roda
e muda
Mãe, o que você vai fazer amanhã?
Mãe, o que você vai dizer amanhã?


Daniel Arcades

sábado, 29 de janeiro de 2011

Para as mudanças

Janeiro está na porta e não terminei a organização anual.... Eita Deus. Volto a postar em fevereiro.
Hoje: muitas, mas muitas peças de roupa para doação. Dentro das análises e do balanço do ano anterior guarda-roupa foi algo que precisa muito melhorar.... Decidi aderir a algumas futilidades e assumi-las em 2011. Com cautela, elas fazem um bem...

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Across the universe


Adoro essa música dos Beatles.

Existe um mundo na minha imaginação com tudo o que se pode ter. 
Inclusive um mestre, mas um meu.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Carta I

MásCaras
CARTA I

Salvador, 14 de maio de 2010

Amós,

Não consegui dizer uma vez na vida por mim para você. A minha boca é seca demais para professar as palavras tão bonitas que queria saindo dela. Mas engraçado, escrever eu consigo. Deve ser pelo costume com o desnudamento das palavras. Então, deixa eu tentar ser objetiva: apesar de não parecer, continuo amando. Só acho que não sei amar e não sei o que seria de mim sem o seu entendimento por tanto tempo do meu jeito de ser. Você cansou, Amós? Por favor, tomara que seja uma mentira. Eu não acredito neste momento vivido por nós dois. Com certeza deve ter sido um sonho mal-vindo, uma pegadinha do destino, uma alerta.Você não pode estar cansado de mim, nem me equiparar as suas velharias do quarto, eu não estou nele e nem nunca estarei. Prefiro ficar e sair como uma surpresa de algumas noites apenas. Não aceito o seu cansaço e nem a sua alma diante destes fatos. Você não pode encarar com tanta simplicidade o seu inexorável ato de amor, Amós. NÃO PODE, NÃO PODE E NÃO PODE! .......................... Nunca pensei na possibilidade de um homem cobrar caricias de uma mulher. Você realmente estão mudando.  Perdoe esta pobre criatura que não sabe expressar seus sentimentos. Penso em você a todo instante, Amós. Em todos os planejamentos está você.

Não concebo a existência da minha carne sem sentir ao menos o cheiro da tua de longe. Não, Amós, não faça isso comigo. Porque a minha face tem a ver com a minha vida por completo, não com você. Não resta outra solução para mim, é impossível viver como uma adolescente de quinze anos e seus sonhos de boneca, não consigo mais enxergar o mundo com ideais e fantasias e promessas de futuro. O meu futuro já acabou. Não dá mais tempo de tentar, tudo, tudo foi embora e a única coisa digna de um brilho nos meus olhos é você, embora não tenha percebido a permanência destes.

Esquece tudo o que fizestes, põe de volta ao menos o seu sentimento dentro de ti. Em momento algum o meu fez menção de mover-se para fora de uma mente vazia como a minha. Tão cheia de soluções nos livros e agora vejo a falta da solução para mim, só sirvo e sirvo para o resto do mundo.MERDA! Sabe, eu acho que escrever me deprime. Péssima escolha esta de profissão, perceber o mundo, analisar casos, ler gente, ler miséria e felicidade, viver vidas inventadas, inventar vidas reais, não, é demais para mim. É angustiante demais passar tanto tempo inventando as coisas para os outros. Perceber tantas possibilidades e eu aqui, sentada nesta cadeira só imaginando enquanto os outros estão vivendo, enquanto você poderia estar vivendo. Ah, e eu não agradeço a você nos meus livros porque sei que não queres guardar nenhum deles na sua estante. Seu  nome neles não seria motivo motivo de orgulho para você, ao menos era o que pensava. Sei que os detesta e se pudesse, queimaria todos eles e quebraria os meus braços para que eu nunca mais escrevesse.  Eu sei o quanto odeia o meu lugar e o quanto suportastes por amor a mim.

Amós, ter a sua história ligada à minha é uma necessidade que tenho. Não jogue fora as nossas tristezas assim, choremos juntos e não separados como quem não merece ter uma companhia para se sentir mais gente. Eu não imaginei que um dia tivesses a coragem de me largar. Confesso nunca ter parado para pensar na possibilidade de não estarmos juntos e tampouco na ideia de ser só. Não conseguirei viver sozinha nesta etapa da vida. Vou me esforçar para demonstrar o meu verdadeiro sentimento por ti. Crie o tempo para esta tentativa, eu já o criei em mim e já ouço o tic-tac pulsante dele.

Amanhã, quando chegares do emprego, estarei na sua casa, sem notebook e sem celular. Somente com um vinho.

E Amós, 
eu te amo. 
E não minto.
Abraços como os que há muito não temos,
Fieda

domingo, 23 de janeiro de 2011

MOMENTO I

MásCaras
MOMENTO I

Esqueci de dizer como é que as coisas são, Fieda. Esqueci completamente de informar tudo o que pode mudar em mim e tudo o que já não quero mais. Comecei a jogar tanta coisa fora. Papéis passados, anotações bobas, roupas, fotografias, brinquedos de infância, cartinhas, sentimentos.  Está tudo lá no fundo da casa para amanhã fazer uma boa ação. Os papéis (picotadinhos, é claro) e os brinquedos vão para a reciclagem, as roupas vão para desabrigados e pobres e os sentimentos vão para outras pessoas carentes, como eu. Doeu transformar aquele espaço super preenchido em vazio, mas percebo que o ato de excluir as coisas é, talvez, a maior ação de amor presente em um sujeito. Livrar-se de coisas, não encher a estante de velharias, desapegar-se. A palavra livrar está atrelada à liberdade e quando a prisão começa a aparecer demais, é porque, Fieda, é preciso um ato de amor. Faz-se necessário chorar alguns dias para que as águas corram pelo corpo e purifiquem este espaço por tanto tempo ocupado, tem que doer para que a contração possa trabalhar e expandir uma próxima entrada, e é assim mesmo, é amando-sofrendo que se deixa. Sem querer deixar. Deixando. Hoje eu saí pelas ruas e comecei a pensar em como é ridículo segurar a vida do jeito que está. Vi o mundo a dois olhos, enxerguei pessoas passeando, sorrindo. Sentei e observei cada individuo que passava pelos meus olhos. E você, consegue me enxergar agora, Fieda? Entende o que tudo se torna? È, eu sou isso mesmo que você está vendo: um egoísta.

Fieda: Sem necessidade.

Eu te faço feliz estando assim? Responde.

 O meu egoísmo é parte do que há de solidário em mim. Eu não consigo mais sentir falta de nada. Sem saídas, sem passeios, sem sexo, sem conversas, sem confissões. Nada disso, Fieda, nada disso me faz falta e é normal conviver com algo assim? Aliás, eu sinto falta de sentir estas vontades. Não dá para brincar de tudo será como antes, tampouco de vamos tentar, a realidade é esta. Joguei muita coisa fora e dentre isso tudo está você. Não porque quero, Fieda, mas por amor.  Só por isso, por prever a sua infelicidade ao meu lado quando for me ver infeliz. Este rosto velho já não contempla mais a criação dos seus estímulos para sorrir, as nossas vontades nunca mais entraram em sintonia, você já não tem mais ciúmes de mim, já se vê fazendo coisas sem mim e eu não tenho que viver assim. Ser egoísta neste momento em pensar por duas pessoas. Estou condenado a uma infelicidade caso continue assim e eu te amo demais para não te ver feliz.

Fieda: Então, é isso? Estou reduzida a um entulho seu.

Pelo contrário, estás saindo de uma gaiola. Há quanto tempo dissestes que me amava, Fieda? Quando foi que a sua boca projetou as palavras ‘eu te amo’? Quando você pensou em deitar ao meu lado e só fazer um carinho na minha nuca enquanto assistimos a um filme do nosso agrado comendo petiscos prontos? Eu nunca mais vi teus olhos de orgulho por estar comigo, nem sua vontade de mostrar para o mundo o quão eu sou importante para você. Lembra aquele livro que você publicou? Ele era lindo, tinha quase uma página de agradecimentos e eu não estava ali. A situação chegou num ponto natural demais para o amor. Amar não é como atravessar uma rua, não se pode simplesmente colocá-lo abaixo dos pés, passar todos os dias e nunca notar a sua beleza. Ficou tudo no você já sabe. Eu já soube. E é essa a lembrança que quero de nós.

Fieda, não me leve a mal, mas não estou partindo do nada. Isso é um acúmulo de tentativas, de justificativas dadas a mim mesmo, de faltas de coragem para lhe falar dos meus anseios. Só hoje, me senti pronto pra deixar o que você já deixou há muito.

Fieda: Não fale por mim. Você não tem este direito.

Então fale por você, diga uma vez na vida para mim por você.

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Pedaço que escrevi para alguma coisa que se chamará MásCaras. 

sábado, 22 de janeiro de 2011

No barulhão do som do meu quarto - PARA LER CANTANDO

Faça a sua música... imagine como é

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És louca, mulher?
Essa.. essa.. dança
Faz a mente sumir
Louca, louca, louca
Faz os arrepios escarafunchar
Essa gaveta minha do corpo
A pela toda começa a coçar
Faz do corpo uma mente
Está louca, mulher?
Essa dança não pode arretar o pé
Não pode sumir de mim
Louca, louca, louca
Teu quadril me dá
Teus par de pernas a mexer
Me envolve – vem me envolver
Louca, louca, louca
Tu és pop?
Eu sou um pobre,
um pobre filósofo
Que quero enlouquecer
Em teus quadris
Me ensina a mexer, louca
Só aqui, neste momento
Para que ninguém ria de mim
Ensina, vai
Louca, louca, louca
Não olha assim....
Não chegue assim...
Não cola assim...
Schiuuuu!
Pra que usar boca?
Louca.

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Ando a ler sobre a necessidade da consciência corporal e seus efeitos. Também um pouco sobre a banalização e o desrespeito com a cultura do corpo. Baixei muita música pop, arrocha, pagode e tudo mais que dizem que não presta e comecei a escutar.
Tem seu momento. Ela tem seu lugar.
É claro que haverão alguns critérios dentro de qualquer campo, mas entendam, não é o campo que é para ser condenado e, aliás, eu ainda não sei nem direito o que é que é para ser condenado. Vi um lugar para eles. E acreditem, não é no mármore do fogo do inferno.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

"Se todas as decisões fossem facéis
Eu juro, meu pai
Que o mundo só era dos grandes."

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Recentes inquietações


Obter uma práxis pedagógica perfeita para a produção completa de conhecimento e um aproveitamento de cem por cento dos objetivos citados em qualquer projeto é como querer tocar um espírito mesmo vendo-o de forma material. Aliás, comecemos este portfólio problematizando conceitos: 1) perfeição. O que vem a ser algo perfeito? O discurso modifica todo e qualquer parâmetro para criar o critério desta palavra. Os valores, o conceito de organização e a própria estrutura do pensamento, além de saber da inexistência denotativa deste vocábulo. 2) conhecimento. A meu ver, a escola – instituição responsável pela socialização de conhecimentos – ainda não definiu muito bem quais os tipos de conhecimentos dignos de serem socializados em uma unidade escolar. Portanto, a partir de estudos e vivências, estabeleço neste portfólio alguns critérios (o qual acredito eficazes para um processo de construção educacional dentro de uma realidade brasileira, baiana e Alagoinhense) e algumas insatisfações ocorridos durante um semestre de Estágio II – componente curricular do curso de Letras Vernáculas da Universidade do Estado da Bahia – UNEB, para o semestre VI.
Este portfólio trata de um relato sobre as oficinas ministradas como um dos critérios de realização da carga horária estabelecida para atender o crédito do componente curricular ministrado pela Profª Msª Aurea da Silva Pereira. Todas as oficinas tinham como objetivo estimular e, se possível, desenvolver a leitura nos estudantes que compartilharam esta experiência.
Prezando por uma diversidade entre as perspectivas de trabalho dos estudantes do semestre VI, quis aliar a prática leitora com a vida que já exerço profissionalmente há algum tempo. Trabalhando não só área de educação, mas educando a partir de uma preferência profissional – artística, mais precisamente, o teatro – propus oficinas voltadas para uma prática leitora a partir da experiência artística, não só pelo contato leitor, mas também pela vivência. No total, foram oferecidas seis oficinas no percurso de quatro meses (de setembro a dezembro).
Estas oficinas também ocorreram devido a forte ligação com a prática de pesquisa desenvolvida pelo Campus II da UNEB. Como sou um pesquisador na área de letras e meu objeto de pesquisa é o fazer teatral[1], envolvendo assim, a construção do processo literário e linguístico neste campo. Estabeleço nos meus estudos uma relação entre a teoria das artes cênicas e a área de letras. Tal relação é notoriamente possível, visto que o teatro lida diretamente com o gênero dramático e constrói em todos os seus elementos signos linguísticos, além da área de letras ampliar os seus horizontes e tomar para si a responsabilidade das leituras de linguagens.
            Segundo os parâmetros curriculares do ENEM, a terceira competência estabelece também algo pouco utilizado tanto nos estudos de linguagens na escola como no curso de letras: “Compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da identidade.”[2] O teatro, prática artística da ação, do movimento interno e externo, da inquietação pode ser uma grande arma para estar a serviço do incentivo à esta prática de leitura.

(...)

Acredito demais na arte como um instrumento transformador dos sujeitos. Acredito mais nela do que o processo de educação escolar. Aprendi a escutar devido ao teatro, aprendi a respeitar vivendo e entendendo outros personagens, aprendi a ler vendo que precisava (como preciso) estudar cada vez mais por aquilo que gosto e aprendi com o teatro a compreender que para criar asas precisava fechar ciclos - e um deles foi a escola básica – e é isso que estou fazendo.
            Sinto-me muito um educador, principalmente pela idade que tenho e no lugar de onde falo. Mas percebo o quão mais funcional é, para mim, o trabalho com o produto artístico. Não sou um educador da lousa e do caderno, não consigo falar pelos livros didáticos, não suporto o esquema da direção de uma escola com suas cadeiras muito arrumadas, com seu medo de ser subvertido. Não, lá no teatro, subverter é a ordem. Na escola, subversão é abominável. Enfim, reconheço a importância deste curso na minha vida e como isso vai refletir em todas as minhas ações, mas quero que sejam refletidas nas minhas ações artísticas. Sou um educador, mas minha sala de aula é um pouco diferente da qual costumo ver.
            Embora perceba que gosto muito mais da minha vida enquanto artista, no momento em que estou aplicando as aulas, senti um grande prazer em poder dialogar com gente. A experiência com as oficinas possibilitaram isto, pois não há um cronograma coordenado por pessoas preocupadas com o conteúdo daquela série e daquele livro didático para a construção do ‘conhecimento’ do estudante.  Trabalhar com oficinas, para mim, que já estou exercendo minha função enquanto professor, mostrou uma abertura maior para a realização de trabalhos mais emergentes para a situação educacional brasileira. O que se vê é um povo necessitado, antes de qualquer coisa, de um entendimento do seu lugar enquanto brasileiro, baiano e alagoinhense e de oportunidades para perguntar, perguntar e perguntar. Quando isso estiver claro para todo mundo, aí sim vai fazer um grande sentido eu mostrar o quão apaixonante é trabalhar com as formas e funções da nossa língua (entender a nossa sintaxe é algo muito belo, sim) e como a brincadeira com a linguagem pode dar força e um sentido único a um texto. 
Mas enquanto seu lobo não vem, vamos testando e utilizando nosso poder de sermos ambivalentes. Vendidos e não-vendidos. Idealistas e realistas. Vamos à vida.



[1] Sou estudante bolsista de iniciação científica com o subprojeto Aspectos obsceno no teatro popular de Lourdes Ramalho, financiado pelo PIBIC/CNPQ e integrante no projeto Acervo de Memória e Tradições Orais da Bahia: Outras Linguagens, coordenado pela Profª Drª Edil Silva Costa.
[2] Disponível em , acessado em 18 de janeiro de 2011.


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Trecho da introdução do meu relatório de Estágio para apresentar no curso de Letras da UNEB, ainda falta fazer os diálogos com os teóricos, e coisa e tal e tal e coisa, mas ando muito inquieto com algumas posturas (inclusive minhas). Estou neste momento escrevendo o relatório que pelo visto vai dar umas 40 páginas... afff... e ainda tem Estágio III e IV.